Deus meu, senhor do céu e da terra, todo poderoso, ó grande pai, por qual motivo, afinal, não viajo? O quê, enfim, fez-me permanecer aqui, nesta cidade imunda, pobre e sem nenhuma importância? É... negócios, negócios e mais negócios; é a única coisa que me prende a este lugar. Mas, diga-me, ó queridíssima Virgem Maria, quais são os meus grandes pecados – os quais, sinceramente, não acredito possuir – que tanto me penalizam? Sinto falta de meus humildes passeios pela Europa, com muitas, realmente muitas, lindas e caras mulheres. Perco, portanto, as grandiosas visitas pela amada França (J'adore Paris!); o adocicado ar inglês; as infinitas noites de Amsterdã. Ah... saudade. Sim, estou saudoso em relação ao primeiro mundo; meu, de fato, verdadeiro mundo. Mas, enquanto sonho, aturo o ódio pelo desencantador carnaval da Bahia. Aliás, para ser ainda mais exato, refiro-me à medíocre festa dionisíaca de Salvador. Isso. Aquela festa (des)animadora, onde milhares de pessoas pulam feito macacos-robôs, prontos para sofrer as conseqüências da estupidez de juntar toda uma cidade para, estupidamente – é bom frisar, novamente –, seguir outro macaco cantante em cima de um caminhão luminoso (ou trio-elétrico, como queira).
Estou, agora, num dos meus amplos apartamentos. Quatro quartos (suítes, claro), cobertura com piscina privativa, salão de visitas, sala de estar e sala de jantar, e, mais importante, uma bela varanda, onde passo várias noites em claro, com o notebook na mão, trabalhando até adormecer, ali mesmo, banhado pelo luar. É, definitivamente, o melhor lugar da casa, até que venha o inferno carnavalesco. Decidi comprar um apartamento com vista – privilegiada, segundo o corretor – para o circuito Barra-Ondina. Portanto, entendo o tédio da festa soteropolitana como, apenas, uma obrigação anual.
Admito, porém, divertir-me em alguns momentos. Estando no alto, tenho uma vista privilegiada, abrangendo toda a multidão da rua principal. Uma bela visão do inferno. Assim, sentia-me um ser infeliz o suficiente para ter um binóculo que pudesse aproximar o necessário para, se quiser, ver até as pernas de Ivete Sangalo – nesse caso, visão dos céus. No entanto, o mais intrigante era capturar imagens de cenas – embaladas com o espírito de luxúria promovido pelas músicas, no mínimo, eróticas – de sexo explícito e, ao mesmo tempo, disfarçado pelo tumulto dos mijados becos de Ondina. Ou, ainda, achar grupos animadinhos fazendo belas orgias carnavalescas. Um nojo total, que, muitas vezes, faz-me rir incontrolavelmente. Rir da imbecilidade das massas, da aculturação geral, dos analfabetos dançantes, de todo o povão carregado pelo show dos ricos para os pobres. Ou, como é mais irônico e estúpido – sim, não canso dessa palavra –, o show dos ricos para os aspirantes a ricos, mais conhecidos como classe média. Isso, aqueles que tem nojo e medo dos que estão do outro lado da corda; aqueles mocinhos e aquelas mocinhas de abadá colorido, saltitantes e felizes por estarem do lado dos endinheirados por 10 vezes sem juros. Macacos. Lindos macacos que me fazem rico e risonho, vendo tudo do alto, como Deus a ver seus filhos no inferno.
Triiin... triin...
– Alô.
– Chefe, todos os abadás, para todos os dias, foram vendidos.
– De todos meus blocos?
– Sim. E as entradas dos camarotes também esgotaram. Sinal de muito lucro esse ano.
Macacos. Belos macacos.
3 comentários:
Leoo finalmente vim aki, aproveitei e passei a noite lendo todos os seus textos...!
No geral gostei de todos, mas especialmente "Aquele dia em que fui abduzida", "Entre línguas" e "Ondulações"...
Gostei da sua forma d escrever, acho que em alguns pontos parece com a minha, embora seja menos intensa e com mais... como digo? Você tem mais material para trabalhar, digamos assim, mais conhecimento.
De qualquer forma, continue escrevendo, provavelmente vou esquecer de voltar aqui - sabe como sou atarefadíssima! -, mas sempre que puder, me dexe um scrap lembrando e eu terei o maior prazer de vir!
Beijos,
Id
Pq eu nao resisto em vir aqui?
O texto ficou muito bem escrito...
o final realmente me fez cair do cavalo...
Mas vc falando assim do MEU QUERIDO E SAGRADO carnaval me decepciona!
RIDICULO!
Vamo passar pro proximo pq esse foi deprimente!
hauahuahauhauahahahuahaa
Seu cult de meia tigela q nao sabe a proveitar a vida \o//
Mesmo assim amo-te e amo seus contos ;p
;*
Gosto do jeito que você maneja ironicamente a classe dominante e simboliza os trejeitos e argumentos dela como conseqüências da própria função social que exercem. Sinto que você indaga se daria para um burguês assumir um outro perfil no cotidiano que não fosse o estereótipo, o clichê, ou seja, a imagem de um sujeito contraditório e frio, já que ele depende dessas característas para vencer na Grande Máquina.
Bom. Final tinindo. =)
Postar um comentário