Eu estava amarrada, amordaçada e, ainda, presa na mala de meu próprio carro. É, inteiramente no escuro e refém dentro de meu Audi A4. Isso! Meu carrinho importado, caro, comprado com o suor do santo trabalho de meu marido deputado, vai ser roubado por esses ignorantes, sujos e mal-educados. Além disso, fui obrigada – desumanamente – a tirar todas minhas jóias de ouro, meus lindos sapados vermelhos Prada (última coleção!) e minha bolsa Louis Vuitton, e, até, sujaram meu precioso vestido Roberto Cavalli. Seria tudo isso justo? Uma mulher de família, da “high society”, educada nos melhores e mais caros colégios de Brasília, obrigada a se submeter a marginais quaisquer, depois de um cansativo dia de compras no shopping.
– Ô, madame, vê se fica quietinha aí, porque a gente vamo pará daqui a pouco.
Onde já se viu, falar tão errado assim? O problema desse país é a educação! Umas boas porradas já educava muitos desses bandidos. Depois dizem que a culpa é do rico, da desigualdade social... Mas que nada! Esses vagabundos não querem saber de trabalhar, se amontoam naquelas imundícies de favela e, ainda por cima, acham que tem direito a tudo.
– Fazemo o que com a mulé?
– Mata.
– Tá doido das idéa? E o deputadozinho de merda marido dela? Vamo aproveitar.
– Tem grana?
– Tá é cheio. Cê num assiste o Boni não, lá do jornal? Os político são tudo bandido, que nem nóis. É, mas é bandido grã-fino, cheio dos terno. E, sabe como chamam eles? A elite brasileira. Tudo barão que tem nojo de povo. Mas eu acho que é medo, de ficar pobre que nem nóis. Por isso foge, faz muro alto, compra esses carro que tem vidro que não fura com bala.
– Então, é essa elite que comanda o país?
– É.
– Tamo fudido.
Um comentário:
Hum. A protagonista? A mulher do deputado. Massa. Conflito dela: estar na mala do próprio carro, controlado agora por uns bandidos maléducados. Desenvolvimento: discussão dos bandidos. Vão matar a protagonista? Seqüestrá-la? E aí, tchum. Tudo rui. O conto não se desfecha, não temos nenhuma idéia do parecer futuro da mulher do deputado. Termina por ser um final de efeito discursivo, a simples renovação de uma idéia ingênua do bandido. Só que ganharia grandes proporções, teria o boom imaginado por você, se a protagonista gritasse pelo menos alguma coisa, participasse do diálogo conclusivo de alguma forma, para que a história se fechasse.
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